1º capítulo

"Para fazer uma obra de arte não basta ter talento.
Não basta ter força.
É preciso também viver um grande amor."
Wolfgang Amadeus Mozart


Homens e mulheres são, realmente, muito diferentes. Imagine um domingo de chuva. Dia perfeito para ficar em casa, saborear uma comida japonesa, assistir a um bom filme. Tudo encomendado por telefone. No meio da tarde, namorar. Depois, namorar de novo. Quando escurecer, pedir uma pizza. E, quem sabe, namorar mais uma vez. Realmente, um dia perfeito.

Mas um casal, normalmente, é composto por um homem e uma mulher. E o que parece perfeito para nós, pode ser um suplício para elas. No início, concordam com a programação sugerida. Chegam a sorrir. E, aparentemente, relaxam na cama. Mas bastam cinco minutos. Os pezinhos começam a se mexer. Ela tira as meias. Depois, vira-se de um lado para o outro. Impaciente, se levanta:

“Tem certeza de que você quer ficar em casa?” “Claro! Não foi isso que a gente acabou de combinar?” A resposta parece boa. Mas nunca funciona. Em seguida, ela diz que é uma perda de tempo ficar enfurnada no apartamento, as costas doem de estar deitada, e que a gente podia sair pra almoçar... “Mas está chovendo! Não tem ninguém na rua.” E ela responde: “Tem sim!” Mesmo sabendo que não tem.

Minha última tentativa: “Amor, todo mundo vai ficar em casa hoje. Está chovendo, é domingo, a gente trabalhou a semana inteira...” Em vão. Com olhar feroz, ela diz: “Eu vou sair!” Esperando que eu responda: “Tudo bem! Vamos sair!” E o grande final começa quando digo: “Vai sim. Liga pra sua mãe. Vê se ela já almoçou. Ou convida alguma prima.” O olhar fica ainda mais enfurecido: “Você vai ficar?” Respondo: “Claro! Está chovendo muito.” Em um minuto e meio, ela se arruma e sai. A batida da porta ecoa pelo prédio.

Três horas depois, telefona da casa da mãe. Diz um “oi” sorridente! Pergunta se já comi, se quero algo da rua. “Obrigado, amor. Já descongelei uma pizza. Fique aí o tempo que você quiser. Aproveite pra conversar bastante.” Afinal, mulheres precisam falar...

No fim da tarde, telefona de novo: “O filme deve estar bom! Você nem ligou pra saber se está tudo bem comigo.” Pergunto: “Que filme?” Ela responde: “Você não disse que alugaria um DVD?” O filme era parte da programação. A tarde seria de namoro. Sem minha linda em casa, foi de sono. “Nossa! Não sei como você consegue dormir tanto!” Nós, homens, sabemos.

Deve haver algum motivo para essa diferença de ritmos. Na internet, encontrei uma resposta. Um site de medicina explicava que as mulheres têm menos serotonina que os homens. Um hormônio que age no cérebro e regula o humor. Três fatores influem na produção dessa substância. Exposição à luminosidade, o que explica a depressão em dia nublado. Atividade física, daí o receio de ficar em casa. E chocolate. Por isso, antes de escolher o prato principal, elas abrem o cardápio na parte das sobremesas. Quer agradar uma mulher? Peça fondue de chocolate antes do salmão.

A delícia negra opera milagres nos corações partidos. Sempre me ajudou a superar as separações. Conselho de amigo também ajuda. Um deles, que já foi casado várias vezes, sugeriu que eu passasse a pensar mais em mim. Organizasse jantares em casa. Viajasse mais. Fosse ao cinema sozinho...

Uma experiência fascinante. Você escolhe o filme. Onde sentar. Se a pipoca vai com ou sem manteiga. Ninguém o interrompe nas melhores partes. Se quiser, pode rir bem alto. Quem vai recriminá-lo? E se não estiver gostando do filme, levanta e vai embora.

Outra experiência interessante é convidar quem nunca foi ao cinema com você. Um colega de trabalho, um companheiro de academia, um primo, a moça da bilheteria... Tenho levado meu irmão. A gente só assiste aos filmes que os dois querem ver. Dessa forma, ninguém se anula. Um erro comum de muitos casais. Mas ainda é cedo para falar sobre isso. Sentamos com uma poltrona vazia nos separando. Cada um fica com dois apoios para os braços. Em outra situação, lado a lado com a amada, ela ficaria com o apoio central. E o homem, com um braço dormente.

E é no cinema do Leblon que começa nossa história. Há pouco mais de um mês, saí revitalizado de uma sessão. Na verdade, já entrei assim. Estava na fila. Relaxado depois de um dia de praia. Sem pensar em outra coisa a não ser na pipoca. Nem sabia qual era a história do filme. Só o título: “Maria, o mito”. Ao lado do cartaz, me perguntei: “Será que vou gostar?”. A resposta veio num tom feminino: “Ouvi dizer que é muito bom! E a crítica está elogiando a mensagem cristã”. A voz era encantadora. Como são as que surgem, inesperadamente, para desfazer nossas dúvidas. A dona, linda. Cabelos loiros, aparentemente naturais. Longos e lisos. Pele sedosa. Mas foram aqueles olhos, quase violeta, que me deixaram fascinado. Diante da cena, só pude concordar: “Então, deve ser bom mesmo!”.

Há situações na vida que parecem estar em câmera lenta. Aqueles cinco minutos que antecederam o filme foram os mais longos dos últimos meses. Faltavam quatro, quando a fila começou a se formar. Numa conjunção perfeita de tempo e espaço, a loira interessante ficou ao meu lado. Com ela, um rapaz que parecia seu irmão. E uma velhinha de cabelos brancos. Muito sorridente. Daquelas que a gente levaria para casa. Acompanhadas da neta, claro!

Diante de uma mulher bonita, não consigo ficar calado. Deve ser meu lado feminino falando mais alto. Só conseguia pensar: “Você é linda! Você é linda!”. Precisava dizer isso a ela. Mas como fazer um elogio naquele instante? Nos segundos em que tramava o galanteio, lembrei de uma situação que me botou em apuros semanas atrás. (...)